A nova matriz energética no setor automotivo veio para ficar. Com atrativos como baixo custo de manutenção, eficiência energética e zero emissão de poluentes, os carros elétricos e híbridos se colocam como opção tanto para o consumidor que deseja um veículo particular, quanto para empresas que precisam de frota. Porém, o segmento ainda é pequeno quando comparado ao setor automotivo como um todo, e eles têm ainda alguns obstáculos e adaptações para se manter no mercado.
Segundo dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), 2024 foi um ano surpreendente para as vendas de carros elétricos e híbridos, atingindo o número recorde de 177.358 emplacamentos entre janeiro e dezembro. O índice é 89% maior em comparação ao ano de 2023, quando foram comercializados 93.927 carros dessa categoria. Só em dezembro, foram 21.634 vendas.
Embora haja um aumento nas vendas e seja perceptível uma maior quantidade de carros elétricos e híbridos circulando pelas ruas da cidade, esse tipo de veículo levanta algumas questões importantes a serem discutidas, como a necessidade de criação de uma regulamentação específica para a instalação correta de carregadores em residências ou condomínios residenciais, a criação de corredores elétricos no Estado e a mudança no Código de Trânsito, que prevê o uso de carros elétricos e com câmbio automático em aulas práticas de direção nas autoescolas.
Recarga
Uma das vantagens anunciadas sobre os carros elétricos é poder fazer a recarga na residência do usuário. Mas, para isso, é necessário avaliar se a estrutura elétrica do local comporta um ponto de recarga e qual a sua capacidade. Além disso, é preciso preparar o local para receber as tomadas e o próprio carregador. Em São Paulo, a regulamentação proposta pelo Corpo de Bombeiros do Estado para vagas de elétricos já iniciou um debate sobre a segurança dos pontos de recarga em garagens de condomínios residenciais e comerciais.
O presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado do Ceará (SINDIPOSTOS), Manuel Novais, informa que os postos de combustíveis são os locais mais adequados para receber os pontos de recarga elétrica. Assim como acontece em São Paulo, Manuel Novais concorda que o Ceará avance na discussão sobre uma regulamentação que determine de forma responsável os locais e formas adequadas de instalação dos pontos de recarga.
“Há debates em outros estados, onde essa discussão está mais avançada, proibindo pontos de recarga em subsolo de prédios residenciais e comerciais, para evitar qualquer tipo de acidente. Acho válido levantar esse debate, pois a segurança deve sempre estar em primeiro lugar”, avalia.
Manuel Novais informa que alguns postos de Fortaleza já estão investindo nos pontos de recarga, mas a procura dos clientes para esse tipo de serviço ainda é pequena. Para ele, há uma fatia do mercado para os veículos elétricos e híbridos, mas, para que eles avancem e conquistem novos compradores, é preciso vencer alguns desafios como promover a facilidade de recarga não apenas na Capital, mas em outras cidades do Interior, por exemplo.
Corredor Verde
Éverton Fernandes, presidente do Sindicato dos Revendedores de Veículos Automotores do Estado do Ceará (SINDIVEL) e diretor da Fecomércio Ceará, acompanha de perto essa discussão. Segundo ele, a criação de corredores elétricos no Ceará está sendo discutida nas Câmaras e Conselhos Empresariais do Sistema Fecomércio Ceará (CACE), da qual é presidente.
Ele afirma que já foram feitos alguns contatos com a Enel Distribuição Ceará, que está realizando um estudo para a implementação de um corredor verde com dez estações de recarga para carros elétricos entre Fortaleza e Jijoca de Jericoacoara. Um dos debates levantados pela CACE, informa Éverton, é se a instalação dos pontos de recarga de energia nos postos de combustíveis do Ceará será em formato de comodato ou de financiamento.
No caso do comodato, a empresa responsável faz a instalação, paga os custos e faz a concessão do equipamento para exploração comercial, sem custo para o posto de gasolina onde esse ponto de recarga será instalado. Já no modelo de financiamento, o posto de gasolina compra o equipamento para recarga de carros e financia o valor, tendo um compromisso mensal de pagar as parcelas, adquirindo, assim, esse equipamento de recarga.
“Tudo isso vem sendo conversado com a Enel, mas o debate já está avançando e acredito que, em breve, teremos algumas opções de corredores verdes no Ceará, como no trajeto de Fortaleza até Jericoacoara e também da Capital até a região do Cariri. Isso já é um avanço”, comenta.
Conforme dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), o Ceará conta com um total de 318 eletropostos, sendo 271 carregadores do tipo AC, que geralmente são chamados de carregadores lentos, e 47 carregadores do tipo DC, que são chamados de carregadores rápidos. O total de eletropostos do Estado representa aproximadamente 3% do total de carregadores existentes no Brasil (10.622), considerando como referência o mês de agosto de 2024.
Éverton não acredita que o mercado automotor será totalmente dominado pelos carros elétricos. De acordo com ele, há uma forte tendência de que esse modelo avance e conquiste mais espaço, porém não será o único. “Não vamos ter, no futuro, uma substituição de carros elétricos por carros a combustão, mas sim, chegar a um momento de convivência de diversas matrizes energéticas, ou seja, o mercado vai ter diversas opções. O fato é que alguns estudos apontam que até 2080 vamos ter uma convivência de diversas matrizes energéticas com o carro a combustão ainda sendo de predominância”, pontua.
Código de Trânsito
A maioria dos carros elétricos não têm câmbio manual ou várias marchas, mas sim um câmbio automático. Eliardo Martins, presidente do Sindicato dos Centros de Formação dos Condutores de Veículos do Estado do Ceará (SINDCFC’S), explica que o processo de formação de condutores é regulamentado no Brasil pela Resolução 789/20 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e prevê apenas aulas práticas em veículos de câmbio manual, não incluindo, nessas aulas, o câmbio automático.
No Senado, o Projeto de Lei 3.688/2024, da senadora Teresa Leitão (PT/PE), altera o Código de Trânsito brasileiro, incluindo no curso de formação de condutores a prática de direção veicular ministrada em veículos dotados de câmbio automático. O projeto está em tramitação na Casa.
Eliardo Martins afirma que torce para que o projeto seja aprovado. Caso isso aconteça, explica, as autoescolas vão poder oferecer mais uma opção aos condutores, lembrando que os carros automáticos já circulam há muito tempo sem que os condutores sejam devidamente treinados pela autoescola para operar esse tipo de câmbio.
Além do mais, a mudança trazida pelo PL 3.688/2024 vai permitir que as autoescolas possam adquirir modelos de carros híbridos e/ou elétricos para a sua frota. “A partir daí, cada empresário vai poder fazer sua avaliação, verificando se é vantagem adquirir os carros elétricos ou não”, avalia.
Carlos Augusto da Silva, presidente do Sindicato das Locadoras de Veículos Automotores do Estado do Ceará (SINDLOCE), avalia que, por enquanto, não é vantagem para ele, como empresário, adquirir os carros elétricos para a sua locadora de veículos. Ele destaca alguns pontos importantes, como a revenda ainda não ser rentável, por serem carros urbanos, além da dificuldade de encontrar peças de reposição.
“Para o segmento de locação de veículos, nós, do SINDLOCE, entendemos que ainda não é uma boa opção. Estamos aguardando o Brasil ter primeiro uma estrutura para receber esse tipo de carro, para que o nosso setor possa, então, ter os modelos elétricos ou híbridos como opções vantajosas para o nosso mercado”, pontua.
Saiba Mais: Confira todas as informações sobre os 35 sindicatos que compõem a base da Comércio Ceará.